Texto narrado no link: https://www.youtube.com/watch?v=w8TanOAaRJ8
“Elias essa coisa de visitas a locais de romarias eu não consigo concordar”.
Estas palavras ouvi de um amigo que hoje não frequenta mais a Igreja Católica, embora na adolescência tenha sido coroinha.
De antemão deixo claro que não tratarei aqui de ataque à livre manifestação a que tem direito o amigo, ou qualquer outra pessoa, mas entendo ser de grande proveito para todos nós refletirmos sobre tal questão.
Sabemos que muitas crenças, ritos e costumes praticados e motivados pela fé são de origem bíblica e/ou da herança judaico cristã. No entanto, há as que nasceram de acontecimentos e vivências populares. E, muitas dessas causam espanto e até desconfiança a muitas pessoas. Isto por desconhecimento de umas e preconceitos de outras.
Fato é que a Igreja (as igrejas) não se dignam a orientar satisfatoriamente seus rebanhos, no sentido de entender e respeitar tais crenças.
Certo dia ouvi de um amigo com quem trabalhava:
– Elias essa coisa de visitas a Aparecida, a Lurdes, a Fátima, esses locais de peregrinação, eu não consigo aceitar!
Após ouvi-lo – respeitosamente argumentei:
– Os locais de visitações, de peregrinações, onde a população crente do Brasil e do mundo coloca em prática sua crença, sua “religiosidade popular”, são locais onde Deus permite que seus “sinais” sejam observados. Então, Aparecida, Lourdes, Fátima, Guadalupe… são alguns locais onde graças/milagres concedidos por Deus aconteceram e acontecem.
A prática de ir, em romarias a Aparecida – por exemplo – é muito antiga. Remonta a mais de 300 anos.
E observei ainda:
– Na época de Jesus, também essas crenças populares existiam. E Jesus não as reprimiu. Não as condenou. Ao contrário, Ele as respeitou.
Aliás, era comum ao próprio Jesus ir orar nos montes.
Alguns exemplos:
“E aconteceu que, quase oito dias depois destas palavras, tomou consigo a Pedro, a João e a Tiago, e subiu ao monte a orar”. (cf Lc 9 28)
“Como de costume, Jesus foi para o monte das Oliveiras, e os seus discípulos o seguiram. Chegando ao lugar, ele lhes disse: “Orem para que vocês não caiam em tentação”. Ele se afastou deles a uma pequena distância, ajoelhou-se e começou a orar”. (cf Lc 22,39-41)
Também naquele tempo era comum as caminhadas – peregrinações – até a locais de tradições, para fazer orações, pedir graças e/ou fazer agradecimentos.
Noutra ocasião o Mestre foi ao encontro da Samaritana, à beira do Poço de Jacó, poço esse que era considerado local sagrado – para os samaritanos. Ali, os moradores da Samaria se encontravam, se serviam da água. Assim faziam porque alimentavam a crença de que aquele poço era sagrado. Uma vez que fora construído por Jacó, que dali deu de beber ao seu gado, à sua família.
“Era-lhe necessário passar por Samaria.
Assim, chegou a uma cidade de Samaria, chamada Sicar, perto das terras que Jacó dera a seu filho José.
Havia ali o poço de Jacó. Jesus, cansado da viagem, sentou-se à beira do poço. Isto se deu por volta do meio-dia”. (cf João 4,4-6)
Tanque de Betesda: fruto de crenças pagãs?
Local sagrado e de peregrinação para os “crentes” do tempo de Jesus e de muito antes dele, o “Tanque de Betesda”, localizado numa área do Templo, era tido como local de prática da religiosidade popular e, Jesus também o frequentou!
Certa vez, quando Jesus foi até àquele tanque pode presenciar a crendice dos cegos, aleijados, surdos, mudos… que permaneciam ali à espera de um milagre.
Imagino que Jesus tenha permanecido ali, bom tempo, observando os desvalidos que se amontoavam chão afora. Ficara tempo suficiente para perceber – no meio de todos – um deles deitado em sua esteira. Ele vivia ali a 38 anos.
Aquele “desgraçado” e tantos outros aguardavam o quê? A manifestação de uma “crendice popular”.
Todos acreditavam na crença, antiga e origem incerta.
De tempos em tempos aquela água borbulhava e criam que era por obra do Espírito de Deus (Javé) e, que no momento exato do borbulhar das águas, o primeiro que pulasse dentro do tanque alcançava a cura.
Foi nesse “local de peregrinação” que Jesus, depois de observar bastante, de se envolver (se misturar) com todos descobriu o tal homem que o despertou atenção. O aleijado em questão estava prostrado, à espera do momento certo para pular, naquele poço para ser curado.
Confira esta passagem de Jo 5,2-9.
“Vendo-o deitado e sabendo que já havia muito tempo que estava enfermo, perguntou-lhe Jesus: Queres ficar curado?
O enfermo respondeu-lhe: Senhor, não tenho ninguém que me ponha no tanque, quando a água é agitada enquanto vou, já outro desceu antes de mim.
Ordenou-lhe Jesus: Levanta-te, toma o teu leito e anda.
No mesmo instante, aquele homem ficou curado, tomou o seu leito e foi andando. Ora, aquele dia era sábado”.
Duas conclusões:
1 – Jesus não julgou e condenou aqueles frequentavam aquele lugar.
2 – Ao ordenar ao homem que se levantasse, tomasse teu leito e andasse Jesus poderia ter completado: você não tem necessidade de estar nesse lugar para receber um milagre.
Afinal, sabemos que milagres podem se dar em lugares mais inusitados possíveis.
Creio que Jesus frequentava lugares assim, para se colocar do lado dos pobres e oprimidos e, ainda fazer suas próprias reflexões, suas orações, se inteirar das necessidades do povo e, eventualmente mostrar aos necessitados “o sinal que buscavam”.
Ah, minha interlocução com o amigo a encerrei dizendo: – não quer dizer que, todo aquele que busca receber uma graça, esteja obrigado a visitar algum local de peregrinação. Ademais, fosse assim o que receberia aqueles fiéis que não possuem condições físicas e/ou financeiras para estarem lá?
Uma graça pode ser oferecida a quem peregrina, mas, também, a quem pratica sua fé, na comunidade, sua paróquia, ou mesmo na sua casa.
Um Testemunho
Quando minhas filhas tinham 10 e sete anos, eu, minha esposa e elas fizemos uma viagem a Aparecida. Lá passamos o dia. Assistimos a Santa Missa, visitamos e reverenciamos a imagem da padroeira e, todos ficamos impressionados com a multidão em peregrinação. A filha mais velha, já bem cansada, murmurou:
– Não sei porque estamos aqui? Não quero voltar mais!
E, eu – certamente orientado pelo Espírito de Deus – argumentei:
Filha, realmente não precisamos estar aqui para mostrar que cremos. Mas é muito bom que vocês presenciem isso. Essa multidão está aqui motivada por sua fé.
Então, basta entendermos e respeitarmos as crenças de cada um. No futuro vocês poderão dizer que conheceram um lugar que as pessoas frequentam em busca de um alívio para suas dores, um sinal (quiçá, milagres) para suas vidas!
Para não mais me alongar fico por aqui.
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Até a próxima.